terça-feira, 24 de agosto de 2010

Natália e o Sacristão





«A Última Loucura de Natália»

Era uma vez uma rapariga chamada Natália. Enquanto adolescente, a loucura fazia parte do seu comportamento diário: nas piadas que contava, na atitude de desafio que manifestava perante os que a confrontavam e no seu relacionamento com o sexo oposto. Natália era assim. Metade doida, metade amorosa. No entanto, a sua generosidade, aliada a uma beleza excepcional, fazia dela a amiga que todas queriam ter e Marcolina adorava-a.

Ao remexer os seus caderninhos de apontamentos, Marcolina encontrou a última carta que Natália lhe escrevera há muito tempo atrás. Fora a sua última carta e Marcolina tinha sido a sua confidente. Lembrava-se ainda do impacto que as suas palavras tiveram em si e do quão chocada ficara com o seu conteúdo.

As loucuras de Natália tinham sido quase todas partilhadas consigo. Sim, Natália tivera a vida que Marcolina abdicara quando entrou para o ensino e se tornou na Marcolina, a Virgolina. Esta era a alcunha dada pelos seus alunos, um tributo ao seu fervor pela correcção ortográfica, ou seja, um investimento emocional que Marcolina agora lamentava face ao novo acordo ortográfico e ao facto de ter tido tantas preocupações durante tantos anos para ter de reaprender a escrever de acordo com as regras que alguém inventara e que apareciam para baralhar a pobre Marcolina, e mais umas quantas professoras à beira de um ataque de nervos. De facto, apesar de Marcolina ainda estar à espera da reforma, esta enfrentava a sua profissão sem o rigor e o empenhamento de outrora, numa atitude que se pautava pela indiferença manifestada na sua famosa expressão «deixa andar, quero lá saber».

Foi com prazer que Marcolina releu aquela carta tão bem escrita, sem erros de sintaxe ou ortográficos, os acentos correctamente colocados e as virgulas que expressavam perfeitamente o estado de espírito de Natália quando as colocara naquele papel ainda perfumado, há mais de quarenta anos, e Marcolina não conteve as lágrimas. Em silêncio, rezou um pai nosso e pediu a Deus que Natália estivesse bem acompanhada e em paz. Decidiu também que a sua história merecia ser divulgada e pegou no seu estojo preferido, retirou uma caneta azul para começar a escrever um texto baseado na última carta de Natália.

Marcolina levou algum tempo a pensar nos vários tipos de texto que poderia escrever: a poesia não era o seu forte e decidiu-se pela prosa. Começaria por escrever um conto e quem sabe se conseguiria desenvolvê-lo e escrever um romance… e a imaginação de Marcolina iniciou o processo de contar na terceira pessoa o que tinha acontecido, na primeira, a Natália, naquela que decidiu chamar «A Última Loucura de Natália». O título estava lançado. Agora só tinha de pensar no resto e Marcolina passou ao acto criativo tão presente na mente das escritoras da moda que escrevem com vidência os pensamentos e os segredos de grandes rainhas e princesas de Portugal. A ideia de também ela se tornar numa escritora famosa de biografias romanceadas, ou de biografias não autorizadas, agradou-lhe. Decidida, envolveu-se no fervor da imaginação e da escrita e terminou o seu texto.Determinada a ser conhecida e famosa, optou por se estrear no meu modesto e simples blog e de proporcionar aos meus queridos visitantes o texto que, e citando a própria Marcolina, «a irá lançar directamente para as «Tardes de Júlia» onde poderá eternizar a memória da sua querida amiga Natália».


Mais se informa que os últimos dias de férias serão utilizados apenas para a revisão gráfica de seu texto e respectiva publicação em pequenos capítulos. Para manter a emoção!!!!

Capitulo I
Sentada na sua pequena cama, naquele quarto minúsculo e parcamente decorado, Natália lembrava o seu passado com amargura. Todos os dias encontrava tempo para ali se sentar e pensar nas loucuras da sua vida; principalmente na sua última.